Publicado em 16/07/2014O grande esforço da Merck & Co. para relançar um suplemento para gado retirado do mercado americano no ano passado está encontrando resistência nos principais processadores de carne bovina do país.
Durante meses, a Merck, que fora dos Estados Unidos é conhecida como Merck, Sharp & Dohme (MSD), vem se preparando para conduzir um estudo em larga escala nos próximos meses para demonstrar a segurança do medicamento Zilmax. O aditivo alimentar era usado amplamente para aumentar o peso do gado americano antes de a MSD suspender suas vendas em agosto de 2013 em função de suspeitas na indústria da carne de que a droga provoca problemas motores nos animais.
A empresa farmacêutica informou que quer testar o Zilmax em cerca de 250.000 animais, no que, segundo a MSD, seria o maior estudo controlado extensivo e aleatório já feito em qualquer suplemento nutricional para gado. Os animais envolvidos representariam menos de 1% do gado abatido nos EUA, mas estão avaliados em cerca de US$ 500 milhões pelos preços atuais, produzindo cerca de 100 milhões de quilos de carne bovina.
A MSD, no entanto, adiou os planos para iniciar a avaliação de campo em função da preocupação da Cargill Inc., JBS SA , e outras processadoras de carne em relação ao bem-estar dos animais, assim como a relutância de alguns processadores em comercializar a carne bovina que seria produzida durante o estudo, segundo pessoas a par do assunto.
A MSD confirmou que o estudo encontrou obstáculos. "Está demorando mais do que previmos", diz David Yates, gerente da MSD que ajudou a projetar o estudo. Ele não quis discutir detalhes das negociações com os processadores, mas assegurou: "Continuamos a trabalhar no processo para ter certeza de que nos alinhamos com todos os interessados."
A pesquisa requer o apoio dos operadores de confinamentos, que engordam o gado para o abate, e das processadoras, que compram e processam a carne em bifes e carne moída. Os três principais processadores nos EUA — Tyson Foods Inc., a brasileira JBS e a Cargill — são responsáveis por cerca de 60% da produção total, de acordo com estimativas da indústria. A JBS também opera um dos maiores confinamentos do mundo nos EUA.
Yates não disse para quando o teste do Zilmax será remarcado. O remédio foi aprovado pela Food and Drug Administration (FDA), a agência americana responsável pela fiscalização de alimentos e medicamentos, em 2006, e cerca de 25 milhões de animais usaram a droga antes da MSD suspender as vendas nos EUA e Canadá.
Nos EUA, a decisão foi tomada depois de a Tyson, a maior processadora de carne do país em vendas, ter informado aos fornecedores de bois que iria suspender suas compras de animais alimentados com a droga porque havia observado problemas ambulatoriais no gado.
Especialistas em saúde animal na indústria da carne relataram, em meados do ano passado, que alguns animais chegavam para o abate mostrando sinais incomuns de perturbação, com alguns andando rigidamente e outros sem conseguir se mover.
A FDA considera a carne de animais alimentados com Zilmax segura para consumo humano.
A Tyson não quis comentar sobre o novo teste proposto pela MSD. Mas um porta-voz disse que a posição da empresa em não comprar animais alimentados com Zilmax "não mudou".
Zilmax, ou zilpaterol, é um beta-gonista, uma classe de drogas originalmente criadas para tratar de asma em humanos. O concorrente Optaflexx, produzido pela Eli Lilly & Co., é feito a partir de um beta-agonista diferente, a ractopamina, considerada menos potente.
No Brasil, a comercialização do Zilmax teve vida curta. Ele foi liberado para comercialização pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento em junho de 2012. Ele começou a ser produzido pela MSD Saúde Animal, braço brasileiro da Merck. Mas, em novembro de 2012, a venda do Zilmax e de outros beta-agonistas foi suspensa pelo próprio Ministério, e o produto retirado das prateleiras, de acordo com a assessoria de imprensa da MSD. A Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec) informou que não é contrária a novas tecnologias que tragam eficiência à produção, mas hoje 60% das exportações brasileiras de carne bovina vão para mercados que não aceitam o uso de beta-agonistas na produção de carne. Segundo dados da Abiec, em 2013, o Brasil exportou 1,5 milhão de toneladas de carne bovina, gerando receitas de US$ 6,6 bilhões. O Brasil tem hoje 208 milhões de cabeças de gado, dos quais apenas 9%, ou 4 milhões, são criados em confinamentos.
Os confinamentos misturam o aditivo na ração animal durante as últimas semanas antes do abate para promover o desenvolvimento da massa muscular ao invés de gordura. O Zilmax pode adicionar cerca de 2% — ou de 10 a 15 kg — ao peso final do animal.
Os confinadores adotaram amplamente o uso de suplementos nos últimos dez anos à medida que os preços do milho, o principal ingrediente da ração animal, atingiram recordes de alta. Mas nos últimos 12 meses, os preços dos grãos caíram fortemente graças à safras volumosas.
Cerca de 70% do gado americano vendido para abatedouros eram alimentados com Zilmax ou com Optaflexx quando a MSD cancelou seu produto, segundo a farmacêutica. As vendas do Zilmax nos EUA e Canadá alcançaram US$ 159 milhões em 2012.
Pessoas próximas aos processadores dizem que as empresas estão preocupadas com a exposição do gado a danos durante o teste. Uma porta-voz da Burger King Worldwide Inc. disse que a rede de lanchonetes "irá avaliar cuidadosamente esse produto antes de tomar qualquer decisão sobre seu uso futuro". As processadoras poderiam vender a carne dos animais usados no teste no exterior mas são poucas as opções. Muitos mercados, como China, Rússia e União Europeia, também proibiram o Zilmax.
Alguns pecuaristas desistiram de usar essas drogas. "Existe uma vantagem definitiva no uso dos beta-agonistas nos confinamentos", diz John Nalivka, presidente da Sterling Marketing, uma consultoria agrícola. "Mas você tem que refletir: 'O benefício [no volume maior de carne] supera o custo da opinião pública?' Acho que a equação esta aí." Com informações do Wall Street Journal.