Publicado em 17/11/2015Com mais de mil animais da raça nelore criados em Porto Nacional, no Tocantins, o pecuarista Alexandre Luiz Ferrari comprou 200 touros e matrizes de cinco cabanhas gaúchas na temporada de primavera. Pela televisão, e com a ajuda de olheiros presenciais, o criador de nelore investiu quase R$ 1 milhão em exemplares braford, que serão adaptados ao clima tropical e cruzados com o rebanho zebuíno característico do norte do país.
O interesse crescente de pecuaristas do Centro-Oeste, Norte e Nordeste por raças britânicas ajudou a elevar as médias da temporada neste ano – 14,7% superiores às de 2014, conforme balanço do Sindicato dos Leiloeiros Rurais do RS (Sindiler. No total, a venda de 5.350 animais alcançou faturamento de R$ 52,11 milhões, alta de 21,86% em relação ao ano passado.
- Pecuaristas que não costumavam comprar aqui, de Estados mais distantes, tiveram participação maior. A procura torna o mercado mais disputado, puxando as médias para cima – confirma Jarbas Knorr, presidente do Sindiler-RS.
O retorno alcançado no cruzamento de nelore com raças britânicas, caracterizado por produzir uma carne de melhor qualidade e mais valorizada no mercado, tem motivado produtores de diversos Estados a fechar negócios em remates gaúchos.
Até 2012, Ferrari trabalhava exclusivamente com zebuínos. Naquele ano, o pecuarista começou a fazer cruzamentos com touros hereford, por meio de inseminação artificial. Em 2013, comprou os primeiros touros braford de um criatório em Rondonópolis (MT) para cruzar com vacas nelore.– No começo, tínhamos receio pela adaptação dos animais em um clima bem mais quente – destaca Ferrari.
Mas os primeiros resultados não deixaram dúvidas. Em 2014, Ferrari passou, então, a comprar reprodutores braford criados no Rio Grande do Sul. Neste ano, ao fazer o maior investimento desde que começou a apostar na raça, substituiu todos os machos nelore por braford.
– A adaptação e a facilidade de manejo ajudaram muito. E o rendimento da carcaça é muito superior. Ganhamos 20% a mais na venda, na comparação com bezerros nelore. Há muita procura de braford por engordadores de boi em São Paulo – compara Ferrari.
Da oferta braford colocada em pista no Estado, a Associação Brasileira de Hereford e Braford (ABHB) estima que 60% das fêmeas tenham sido negociadas para fora do Rio Grande do Sul. O percentual é 50% superior a 2014, compara o CEO da entidade, Fernando Lopa. Entre os reprodutores, pelo menos 20% foram comprados por pecuaristas de Paraná, São Paulo, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás e Tocantins.
– Há alguns anos, não se vendia nenhum touro para Goiás e Tocantins – lembra Lopa, apostando em crescimento ainda maior nos próximos anos.
Durante esta temporada, a raça braford alcançou média de R$ 10,5 mil nos machos e R$ 3,6 mil nas fêmeas, conforme balanço do Sindiler. Com um dos animais mais valorizados da temporada, a Estância Bela Vista, de Santana do Livramento, teve pela primeira vez a participação de compradores da Bahia e do Tocantins.
– O nosso gado se alastrou para todo o país. E a procura cresce ano a ano – confirma Celina Albornoz Maciel, proprietária da cabanha, que teve média de R$ 21,01 mil nos touros em remate feito em outubro.
O interesse de pecuaristas brasileiros cresce também na raça angus. A média dos machos chegou a R$ 9,2 mil, enquanto a das fêmeas totalizou R$ 2,8 mil.
– Vendemos angus até para Alagoas e Pará. À medida que os pecuaristas percebem que a adaptação é possível e comprovam os ganhos, o interesse aumenta – confirma o presidente da Associação Brasileira de Angus, José Roberto Pires Weber, acrescentando que o cruzamento realizado entre nelore e angus se dá também por meio de inseminação artificial.
Milhares de quilômetros e frete dividido
Dispostos a melhorar a qualidade do gado nelore, fazendo cruzamento com raças mais nobres, pecuaristas compartilham os custos para transportar os animais por milhares de quilômetros. Do Rio Grande do Sul até o Tocantins, por exemplo, o frete passa de R$ 1 mil por cabeça.
– O interesse é tanto que o comprador não se importa em arcar com o custo de deslocamento, normalmente dividido com o vendedor – destaca Marcelo Silva, diretor da Trajano Silva Remates.
Entre os 371 compradores em 10 remates realizados pelo escritório durante esta temporada, 20% eram de fora do Estado.
– Neste ano, eles tiveram importância maior, especialmente pela participação de pecuaristas da região do Matopiba – completa Silva, referindo-se aos Estados que formam a nova fronteira agrícola brasileira – Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia.
O crescimento dos negócios na pecuária é resultado, ainda, conforme o leiloeiro Fábio Crespo, da capitalização do produtor brasileiro.
– Esse comprador não depende de financiamento bancário. Ele investe por se tratar de um mercado firme, com liquidez – resume Crespo.
Adaptação à seca e aos carrapatos
Ao levar animais acostumados com temperaturas mais amenas para regiões de clima tropical, onde o período de seca se prolonga por seis meses do ano, pecuaristas precisam mudar o manejo nas propriedades.
Com comportamento diferente do zebuíno nelore, bovinos de raças britânicas exigem um cuidado maior a campo no período de adaptação – especialmente em relação à alimentação e a pragas como o carrapato.
– Nosso clima é diferenciado. Temos algumas barreiras que estamos conseguindo ultrapassar com tecnologia e manejo – conta Rita de Cássia de Souza, pecuarista que administra fazendas em Brasília (DF) e Santa Terezinha de Goiás (GO), próximo à divisa com Tocantins.
A criadora de nelore está no segundo ano de experiência com brangus, iniciada com matrizes criadas no Rio Grande do Sul.
– O resultado não poderia ser melhor. Já temos encomendas aqui em Goiás de touros brangus que nasceram no ano passado – conta a pecuarista, que faz recria e terminação dos animais.
Em outubro, Rita comprou reprodutores angus no remate da Cabanha Capanegra, de Dom Pedrito. A ideia é fazer projetos-piloto na fazenda para ver como os animais irão se comportar no clima do Centro-Oeste. Com informações do Zero Hora.