Publicado em 11/08/2017"O setor econômico percebe um outro ar." Logo após deixar o prédio da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), na avenida Paulista, o presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), o deputado federal Nilson Leitão (PSDB-MT), explica que o respiro mais aliviado do mercado é evidente e consensual nos setores agrário e industrial.
"Não está um pouquinho melhor. Está muito melhor. Estamos com a inflação em menos da metade do que estava havia um ano. Estamos com juros de um dígito. Os Estados produtores sentiram isso de forma muito forte. É um novo momento." Em hipótese alguma a melhora é radical, ele admite. "Mas avançou muito. Os números hoje da economia são infinitamente melhores do que eram havia um ano. Então é claro que isso pesa, sem dúvida nenhuma", analisa o parlamentar, que havia acabado de participar de uma reunião do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp.
No comando da hoje considerada uma das mais poderosas bancadas do Congresso, a frente do agronegócio - ou bancada ruralista -, e também uma das principais fiadoras da sustentação de Temer no governo, Leitão tem acesso fácil ao Palácio do Planalto. A Frente Parlamentar Agropecuária conta hoje com 200 deputados e 24 senadores inscritos, de diferentes correntes partidárias. Em votações relevantes, geralmente a bancada levanta cerca de 140 a 160 votos fechados. No dia seguinte à reunião com a Fiesp, o parlamentar, do Mato Grosso, já estava em Brasília.
A frente parlamentar do agronegócio "recebeu" Temer e seu séquito - o ministro da Agricultura, Blairo Maggi (PP), e o ministro da Secretaria do Governo, Antonio Imbassahy (PSDB), que cuida das articulações com o Congresso e liberações de emendas para parlamentares - para um almoço, encontro tradicional da bancada todo início de semana.
O movimento do presidente de ir até a bancada ruralista um dia antes da votação da denúncia contra ele no Congresso - ser recebido pelos parlamentares, e não recebê-los - é um evidente sinal da força dos ruralistas para pautar a agenda do Congresso.
De fato, a bancada ruralista "já levou" muitas desde a posse de Temer. Logo no início do mandato do peemedebista, a Casa Civil suspendeu 13 processos de demarcações de terras indígenas que estavam prontos, apenas aguardando homologação presidencial. O Ministério da Justiça, que posteriormente seria comandado pelo deputado Osmar Serraglio (PMDB-RS), da bancada ruralista, também sustou outros seis processos de demarcação. Temer endossou meses depois um parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) que proíbe reconhecer como área indígena qualquer reserva que tenha se formado depois da Constituição de 1988, um entendimento que já tinha sido firmado pelo STF no caso da Raposa Serra do Sol.
Mimo presidencial
Os ruralistas foram agraciados com outro mimo presidencial: conseguiram negociar dívidas da previdência rural por meio de uma medida provisória sobre o Funrural. O Supremo decidiu, em março, que a cobrança da previdência rural de pessoas físicas era constitucional. Sob pressão, Temer editou a medida que reduziu a alíquota de contribuição e permitiu o pagamento de débitos em até 176 vezes. E o Congresso ainda pode amenizar ainda mais as regras, ao votar a medida provisória e modificá-la num projeto de conversão.
"Não tem como tratar isso como troca de favores", afirma Leitão. Segundo ele, "desde o primeiro dia" do mandato presidencial de Temer, a Frente Parlamentar da Agropecuária entregou uma pauta com os assuntos de interesse da bancada. "São temas que estavam na gaveta havia 30, 20 anos. Fizemos uma cronologia disso no início do mandato do Temer. E vem acontecendo normalmente. Não é algo que aconteceu nesta semana ou a partir da denúncia. É o que vinha acontecendo havia muito tempo, com várias reuniões [com o governo]. Algumas dessas ações entraram e saíram, e outras estão aí no forno para poder entrar. Mas nenhuma se iniciou com a denúncia, é muito claro isso", diz o deputado ruralista.
Outra vitória da bancada ruralista foi a Medida Provisória 759, que tratou da regularização fundiária.
O presidente da FPA rebate as críticas. "Quem mora no Norte e Nordeste do país sabe o problema que é, você está há 40 anos na área, produz e não tem título, morre e não pode deixar de herança para seu filho. Não entendo como esses setores podem querer criticar a titularização de terra no Brasil. E quem está na favela? Ele invadiu há 50 anos, é a casa dele, não vai sair mais de lá. Não pode ter o título daquela propriedade? Ou vai passar de neto para bisneto morando em área ilegal?", argumenta Leitão.
Na boca do forno
A pauta da bancada ruralista está em alta e, como diz o próprio presidente da frente do agronegócio, há muitos projetos e medidas "na boca do forno" para serem aprovados, como quer o setor. Um caso iminente é o polêmico marco regulatório do licenciamento ambiental, a próxima batalha. O Projeto de Lei 3.729 tramita no Congresso desde 2004 e já houve inúmeras alterações (substitutivos) diante da polêmica do tema e falta de consenso. O relator é o deputado Mauro Pereira (PMDB-RS), também da bancada ruralista.
Pereira está otimista com a aprovação do projeto e afirma que a relação com o atual governo não poderia ser melhor. "Eu falo com o presidente Temer todos os dias. Tenho autorização para isso. É um governo parlamentarista. Então isso é muito bom." O Brasil, segundo Pereira, é respeitado no mundo por sua produção de alimentos. Ele acrescenta que, no cenário de atual recessão econômica, quem impede o naufrágio e assegura algum crescimento do PIB é o agronegócio. "Então todos [no Congresso e no governo] tratam o agronegócio com a palma da mão", afirma.
"Estamos aí com 13 milhões de desempregados. Quem vai gerar emprego para esse povo é a iniciativa privada. Não é o presidente Temer, não. Todo mundo trata muito bem o povo do agronegócio. Todos. E o presidente Temer, nem se fala, porque Temer é uma pessoa muito educada, é um gentleman, uma pessoa fantástica. Isso aí é bem natural", afirma o relator do projeto de licenciamento ambiental. Segundo ele, após inúmeros debates, chegou-se a um consenso sobre o tema. "Esse projeto já está pronto para ser votado. Depois de 12 anos, e de um ano sob minha relatoria, existe um consenso total."
Em nota, o Ministério do Meio Ambiente afirmou que "o texto desenvolvido sob coordenação do MMA está próximo de um consenso técnico e político". Esse debate com os parlamentares, acrescentou o ministério, "será concluído o mais breve possível, com o cuidado de evitar açodamentos que possam resultar em retrocessos ambientais". O objetivo do projeto, explicou o ministério, na nota, "é elaborar uma lei que balize o licenciamento ambiental no país, assegurando eficácia e consistência técnica". "O licenciamento é uma das principais ferramentas da Política Nacional do Meio Ambiente e necessita de uma base legal adequada."
Com seu pragmatismo ímpar, Leitão admite, ainda, que há outra polêmica sobre "uma tal de área de relevância". E explica, didaticamente: "Você é dono de uma propriedade rural, produz mamão papaia. Descobriu que lá tem um passarinho do peito azul e bico amarelo que é uma raridade. Aí o Ibama tem todo o direito, de acordo com a proposta deles, de ir lá e cercar aquela propriedade como área de preservação e relevância. Mas a responsabilidade é sua, como produtor, de não deixar o passarinho morrer. O que não concordamos: isso não pode ser feito sem estudo. O Brasil tem que parar de fazer lei sem estudo".
Se depender da bancada ruralista, qualquer menção sobre área de relevância deve passar longe do marco regulatório do licenciamento. "Tem que gastar dinheiro com tecnologia e fazer um plano diretor das áreas de preservação que precisam ser renovadas ou instaladas, e áreas de relevância. Com estudo técnico. Não pode é dizer: olha, apareceu um passarinho então vou criar uma área ali. E o proprietário, como é que faz? E o planejamento da vida dele?", diz Leitão.
Há ainda dois temas que os ruralistas querem mexer até o fim do ano: autorizar a venda de terras brasileiras a estrangeiros e também mudar regras referentes ao uso de agrotóxicos no país. Terras estrangeiras é um assunto que só deve começar a ser debatido no mês que vem, diz Leitão. "No meio do caminho", há ainda mais pólvora: as medidas provisórias, a 756 e a 758, que tratavam de novas reservas de preservação ambientais. Essas duas MPs, que tratavam de alterações em áreas ambientalmente protegidas no Norte do país, foram integralmente vetadas por Temer, um dia antes de o presidente embarcar para uma viagem pela Europa. Com informações do Valor.