Publicado em 09/10/2019Em meio aos esforços estatais para reduzir a dependência de importações de carne de frango, a Arábia Saudita restringiu drasticamente as compras de alimentos produzidos na fábrica da BRF em Abu Dhabi, capital dos Emirados Árabes Unidos, apurou o Valor.
Oficialmente, os alimentos industrializados à base de frango feitos na unidade foram barrados depois de uma auditoria do governo, explicou uma fonte. A Arábia Saudita tem essa prerrogativa porque a fábrica, inaugurada em 2014, foi construída com incentivos fiscais do Conselho de Cooperação do Golfo — além dos sauditas, o órgão é composto por Emirados Árabes Unidos, Barein, Omã, Catar e Kwait.
Segundo duas fontes, porém, a avaliação é que a restrição imposta pelo governo saudita é um recado para a BRF. A Arábia Saudita não abre mão do objetivo de abastecer 60% de sua demanda doméstica por carne de frango com produção local a partir de 2020.
Na prática, a barreira do governo saudita tira o principal mercado da fábrica do Oriente Médio. Segundo uma das fontes, a Arábia Saudita absorve pelo menos 30% das vendas da planta de Abu Dhabi. No segundo trimestre, a BRF produziu cerca de 40 mil toneladas de produtos processados no mercado halal (que segue os preceitos muçulmanos).
Procurada, a BRF informou que “a planta de Abu Dhabi passa por auditoria para atestar o valor agregado na produção local, segundo as regras do GCC. A empresa tem estoque suficiente na região e direciona sua produção a outros mercados do Golfo até que o fluxo comercial seja totalmente restabelecido”.
Em favor da BRF, também pesa o fato de a exportação de carne de frango in natura a partir do Brasil para a Arábia Saudita, principal via da acesso da companhia no país, continuar normalmente. Entre abril e junho, o negócio halal da BRF comercializou 258 mil toneladas de carne de frango in natura — o que inclui outros mercados que não apenas o saudita —, conforme o último balanço divulgado pela companhia. A receita líquida da BRF no mercado halal supera os R$ 8 bilhões por ano, cerca de 25% da faturamento total.
Paralelamente à barreira aplicada à fábrica de Abu Dhabi, a BRF segue negociando com os sauditas a entrada no mercado local de carne de frango. Com isso, a companhia atenderia aos interesses do país de ampliar a oferta local da proteína.
As negociações da BRF na Arábia Saudita, no entanto, não são fáceis. De acordo com uma fonte graduada, a empresa brasileira manteve tratativas com a Saudi Agriculture and Livestock Investment (Salic), veículo de investimento ligado ao fundo soberano do país árabe. No entanto, a demissão do presidente da Salic, Matt Jansen, deu outro rumo às negociações.
Uma das possibilidades avaliadas pela BRF para fechar com um parceiro na Arábia Saudita era envolver justamente a fábrica de Abu Dhabi e as operações de distribuição de alimentos no Oriente Médio. Conforme o Valor já informou, a BRF ofereceria uma fatia minoritária nesse ativos e, em troca, se tornaria sócia de um produtor de frango saudita. A Salic chegou a sinalizar com uma proposta de US$ 300 milhões — os ativos da BRF na região valem mais do que os negócios de produção de frango na Arábia Saudita. Por isso, a empresa receberia esse montante.
Com a Salic mais distante, ainda não está claro como será a formatação do acordo na Arábia Saudita, mas a BRF corre contra o tempo para costurar um acordo. Uma fonte argumentou que as restrições à fábrica de Abu Dhabi e a parceria para a produção de frango na Arábia Saudita são questões independentes, mas não negou que o acordo com um produtor de frango do país ajudaria a resolver o imbróglio da fábrica.
Para a BRF, o ideal é anunciar o acordo com um parceiro saudita durante a visita do presidente Jair Bolsonaro à Arábia Saudita, no fim de outubro. O CEO da companhia, Lorival Luz, acompanhará a visita do presidente. De acordo com duas fontes, a BRF negocia com um produtor de frango de médio porte da Arábia Saudita e um desfecho favorável pode ocorrer em breve, embora problemas de última hora seja comuns em negócios do gênero. Com informações do Valor.